domingo, 26 de julho de 2009
Interiores
Precisava se afastar nem que fosse por um instante da proximidade física dos filhos e do marido. Levantou-se, o corpo um pouco menos gracioso do que de costume, deixou sem querer que o braço derrubasse a taça de vinho sobre a mesa. Um filete vermelho e cristalino escorreu para o chão, brilhando como minúsculas ilhas de luz.
Andou, o passo incerto, como se o vinho agora tivesse tomado conta do seu rumo. À janela a noite lá fora colou no seu peito uma dor. Mas a noite, pobre noite, não tinha nada a ver com essa história. Ela então permitiu que o ar cristalino tocasse seu rosto esquecendo o apelo das estrelas que a convidavam a voar. Súbito olhou sua sala onde tudo parecia harmonioso.
O que se passa querida? A voz do marido vem de longe como se ela não mais a reconhecesse. Mas os fios grisalhos que descem pela nuca dele tecem o desejo de trazê-la de volta à intimidade dos anos bem vividos. Reconhece no gesto da filha à mesa, ao levar a mão ao rosto como se afastasse um pensamento triste, o seu próprio gesto, o de sua mãe, o da avó na fotografia.
Ela sentiu então que coisa estranha era a vida.
Maria Helena Mossé
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Leve e bucólico, como costumam ser seus textos, Maria Helena. Bjs
ResponderExcluirMQOS
me identifiquei e gostei...
ResponderExcluiraté a foto tem a ver comigo...
beijos com carinho
a.
Bonito e feminino. Adorei a foto.
ResponderExcluirBeijos.Angela L.C
8 de Outubro